Capítulo 15
As coisa foram voltando ao
normal pela casa pouco a pouco. Bem devagar, mas foram. Obviamente nós não
íamos ficar todas sofrendo para todo o sempre. Dor de cotovelo é legal e é
necessário curtir um fundo de poço de vez em quando, mas o importante é saber
que tem que continuar.
Então nós estávamos
continuando.
Mary tinha acabado de ser
chamada para seu primeiro projeto grande na agência de propaganda que
trabalhava, Jane tinha virado a queridinha de sua chefe, Kitty tinha sido
chamada para ajudar em um projeto importante e até Lydia estava namorando algum
boy ai que ela não queria nomear.
Todas estavam indo bem e a
coisa toda com Darcy e Bingley virou meio que uma memória.
Eu também estava indo muito
bem, obrigada por perguntar. Um processo gigantesco brotou na firma onde eu
trabalho e todo mundo estava a todo vapor para organizar tudo o mais rápido
possível, porque a data da audiência preliminar estava chegando.
A melhor parte era que a
última sexta-feira de agosto ia ser feriado! Eu nem tinha planos para fazer
coisa alguma, mas meu chefe estava de bom humor porque um caso anterior nosso
deu muito certo e todos que trabalharam nele iam poder sair mais cedo na
quinta-feira.
Ou seja, eu tinha um pouco
mais de tempo livre para fazer algo. Só faltava decidir o que fazer.
Então no sábado anterior ao
feriado eu recebi uma ligação.
-Lizzie Bennet!
-Emma Woodhouse!
Emma Woodhouse era uma das
minhas grandes amigas na escola. O que é engraçado, porque Emma é mimada ao
extremo e eu geralmente não me dou bem com esse tipo de pessoa. Porém ela
sempre foi uma mistura bem curiosa de menina mimada e pessoa com um coração
absurdamente generoso. O pai dele sempre foi muito protetor (além de
hipocondríaco e workaholic) e acabou fazendo dela uma mistura curiosa de
independente e apegada. Ela gosta de gerenciar a vida das pessoas ao redor dela
e faz tão bem que ninguem nem percebe que está sendo gerenciado até ser tarde
demais.
Mas Emma é uma mulher
incrível e é pura diversão.
-Eu estou te ligando para te
fazer um convite. –ela falou animada.
-Diga.
-Como estão seus planos para
o feriado? –ela quis saber.
-Nada demais. Meus pais vão
viajar, então não estou indo para casa.
-Quer vir para Portsmouth?
–ela perguntou na hora –Eu preciso desesperadamente de um ombro amigo.
Hum, interessante. Emma
dificilmente pedia socorro.
-Claro. Por que não? –eu ri
com o grito animado dela –Eu vou ser liberada do trabalho as 16 na quinta.
-Vem pra ca então! –ela falou
na hora –Você chega a tempo do jantar e nós podemos passar a sexta fazendo
nada!
A animação de Emma era
contagiante e, antes que eu pudesse pensar melhor, ja tinha concordado.
XxX
Eu acho que não comentei
isso antes, mas eu e as meninas temos um carro. Na verdade verdadeira ele é da
Mary, os pais dela deram de presente quando ela entrou para a faculdade.
Imagina a idade do negócio.
Nós não costumamos usa-lo
porque andar de carro em Londres é quase impossível, além de ser caro
estacionar e coisa e tal. Normalmente nós deixamos para quando vamos viajar
para ver nossos pais.
Eu pedi para Mary para usar
o carro para visitar Emma e ela deixou. Todas ja tinham programas para o fim de
semana, então eu fui sozinha. Curiosamente Jane e Kitty também estavam visitando
amigas nossas da escola; Jane tinha ido ver Elinor e Marianne Dashwood e Kitty
foi ver Catherine Morland.
Emma mora em Portsmouth, que
fica a pouco mais de duas horas de carro daqui de Londres. É uma cidade
portuária super importante. Aliás, é o negócio do pai dela: ele faz transporte
marítimo e é dono de 1/3 das docas que existem lá.
Eu saí do escritório na
quinta direto para a estrada. Lucy (como chamamos carinhosamente o carro) é
velha, mas é firmeza. Eu gosto de dirigir e sentir a paz da estrada, sentir o
vento no meu rosto e poder pensar com calma.
Aliás, eu tenho feito muito
disso: pensar. E quanto mais eu penso, mais confusa eu fico.
A raiva passou. Eu não sinto
mais tanto dela quando penso em Darcy e Bingley. Eu me sinto desapontada. Bastante.
Eu sinto que, por algum motivo idiota, esperava mais dos dois. Eu esperava mais
caráter, mais coragem.
Claro que eu até tenho que
dar crédito pro Darcy: ele veio se declarar para mim na cara e na coragem e
todos sabemos que isso não é fácil. Tá, ele foi um animal e só falou besteira,
mas ele tentou mesmo assim.
É só um pouco de crédito,
mas é melhor do que o saldo negativo que ele tinha antes.
E eu sei que esse assunto
está encerrado, morto e enterrado, mas não consigo parar de pensar em tudo o
que aconteceu. Todas as vezes que nós nos falamos, todas as vezes que eu o
peguei olhando para mim... E ainda não consigo entender como fui tão burra, tão
cega.
De certa forma acho que tem
muito a ver com a minha implicância com ele. Ele feriu meu orgulho quando nós
nos conhecemos e eu nunca gostei do jeito que ele tratava minhas amigas. Mas eu
acho difícil acreditar que foi só isso que me impediu de perceber.
As meninas disseram que era
óbvio (embora nenhuma delas tenha se dado ao trabalho de me informar), então eu
devia ter percebido! Eu nem levei a parada da bunda a sério. Se bem que,
sejamos honestas, homens olham para bundas e não tem muito a ver com amor
eterno.
Não que Darcy tenha me
jurado amor eterno. Aliás, ele parecia querer des-jurar amor bem rapidinho
depois que eu dei um fora nele.
Homens.
Eu peguei um trânsito
desgraçado na saída de Londres, o que acabou me atrasando bastante. Mesmo assim
eu cheguei em Portsmouth pouco depois das sete. A vantagem do nosso “verão” é
que o sol ainda estava brilhando forte no céu quando Emma desceu correndo as
escadas da entrada de sua casa.
-Elizabeth Bennet! –ela
gritou jogando os braços em volta do meu pescoço.
Eu quase caí para trás, mas
consegui me apoiar no carro a tempo.
-Emma Woodhouse. –eu respondi
abraçando-a –Parece que faz um século que eu não te vejo.
-Faz mais de um ano. –ela
falou separando-se brevemente do meu pescoço –Nem parece que nós moramos tão
perto. –suspirou –Eu preciso ir para Londres.
-Sim, você precisa. –eu
sorri.
Emma é muito bonita. De
verdade. Ela parece uma Barbie, toda loira, com suas roupas sempre perfeitas e
aqueles enormes olhos azuis. Eu sempre achei engraçado como, embora ela tenha a
mesma idade que eu, Emma sempre pareceu mais jovem. Muitas pessoas acham que
ela tem 18 ou 19.
-Meu pai está super animado
com a sua presença. –ela me informou.
Sr. Woodhouse era uma figura
bem curiosa. Como eu disse antes ele é hipocondríaco e workaholic, então
conversar com ele é diversão garantida. O Sr. Woodhouse me lembra muito o meu
pai, então eu sempre gostei de conversar com ele. Não sabia que era recíproco.
-E o George vai vir jantar
conosco. –Emma me informou.
-Ah, o George... –eu abri um
sorriso divertido –Ele continua sendo aquela coisa linda pela qual todas nós
babávamos?
Emma fez um cara de nojo.
-Sinceramente, eu não sei o
que vocês sempre viram nele. –ela falou –O George não é lindo.
-Claro que ele é! –eu
protestei –Você não pode dizer que não só porque cresceu considerando-o um
irmão.
Emma revirou os olhos e eu
ri. Aquela conversa era tão velha quanto a nossa amizade.
Emma tinha um vizinho/amigo
da família que era bem mais velho que ela, chamado George Knightley. A irmã
mais velha de Emma, Isabella, casou com o irmão caçula dele. Ele sempre
frequentou a casa da família e quando nós o víamos, nós nos derretíamos, não só
porque ele era muito charmoso e tinha um sorriso incrível, mas também porque eu
nunca vi um homem mais educado e maduro em toda minha vida. Claro, Bingley era
uma gracinha e um princípe, mas George era um lorde. Mas se fazia 1 ano que eu
não via Emma, devia fazer 5 que eu não via o famoso Sr. Knightley.
-Deve ser por isso que você
nunca se envolveu como homem nenhum. –eu comentei distraidamente –Com um cara
como George em volta, você deve esperar muito dos meros mortais. Ele elevou
suas expectativas.
-Homens são criaturas
idiotas e eu serei feliz se nunca mais ver um. –ela resmungou.
Isso capturou minha atenção.
Emma sempre falou que não ia se casar nunca, mas ela nunca foi amarga ou alguém
que odiava homens.
-O que aconteceu? –quis
saber.
-Bom, é uma longa história.
–ela suspirou –E justamente porque eu preciso de apoio moral.
-Ah Emma... O que você
aprontou agora?
XxX
Como eu tinha dito antes,
Emma adora se meter na vida alheia, mas dessa vez tinha se superado. A história
de forma resumida era a seguinte: ela tentara unir sua assistente pessoal (uma
menina chamada Harriet) com um promissor jovem advogado (chamado Philip) por
meio de muitos esquemas. Ela achou que tudo estava indo bem, até ela descobrir
que, na verdade verdadeira, Philip estivera interessado nela, não em Harriet. E pior ainda, interessado nela pelo status e dinheiro que a família dela
tinha!
Philip tentou se declarar
para Emma, ela deu um fora nele (obviamente) e agora, menos de quatro meses
depois, ele estava noivo! Pelo jeito ele queria só casar mesmo e qualquer
mulher com dinheiro ia servir.
Emma estava sentindo-se
culpada, porque ajudara Harriet a criar expectativas (e se conheço bem Emma,
ela praticamente enfiara as expectativas na goela da menina), só para ver que
estivera completamente errada, fazendo a menina decepcionar-se.
-Eu nunca mais vou me
meter na vida dos outros. –Emma jurou ao
terminar de contar a história.
Eu tive que engolir uma
risada.
-Sério! –ela protestou
–Chega desse negócio de dar palpite. Agora só se me pedirem.
-Emma, quando você quer dar
palpite na vida alheia você considera até um olhar como um pedido. –eu
indiquei.
-Ei, eu sou boa em perceber
sinais sutis!
Ela era boa em inventar
sinais, isso sim.
Quando entramos na sala
(porque gente rica aparentemente se encontra numa sala pré-jantar) o pai de
Emma, sr. Woodhouse, estava conversando com...
Uau.
Uau.
Sinceramente, eu não consigo
entender essa parada da Emma não querer pegar esse homem!
-Lizzie! –sr. Woodhouse
falou com sua voz alta –Quanto tempo! Você lembra de Knightley?
Opa se eu lembro. Eu apertei
a mão do pai de Emma, então virei-me para George.
-Oi, Knightley. –eu sorri
–Faz muito tempo que eu não te vejo.
-George está bom, Lizzie.
–ele sorriu para mim –E sim, faz muito tempo. A última vez que eu te vi você
estava indo para a faculdade.
-Nossa. –eita, fazia mais
tempo do que eu achava –Eu ja formei e estou até trabalhando em Londres.
-Eu lembro de Emma
comentando algo do tipo. –ele falou lançando um rápido olhar para Emma –Você
está morando com as outras meninas, certo? Como estão Jane e Lydia?
Em questão de idade eu,
Jane, Lydia e Emma temos a mesma. Mary e Kitty são as mais novas, mas elas
sempre vieram no pacote.
-Elas estão bem. Todas
trabalhando.
-Mas morando em Londres,
Lizzie! –Sr. Woodhouse falou de repente –Trabalhar é ótimo e todos deviam
fazer, mas Londres? Aquela cidade é um perigo para a saúde de qualquer um!
Aquele tanto de gente! Imagine as bactérias, fora os acidentes, os bebâdos...
Um perigo.
-Pai. –Emma suspirou.
Acho que algumas coisas não
mudam mesmo.
XxX
E daí durante o jantar o
universo provou que quer acabar comigo. Eu estava conversando com Emma,
enquanto George estava conversando com o sr. Woodhouse quando eu escuto...
-... nossos advogados
aconselham. Embora Darcy seja da opinião que...
Sério! Não é possível! Esse
homem é onipresente?
-Darcy? –eu cortei antes que
pudesse me conter –Darcy Darcy? O advogado da DeBourgh que não tem um nome?
George virou para mim
confuso.
-Eu estava pensando em Fitz
Darcy, mas eu conheço Darcy Darcy, o primo sem nome. –ele falou com um pequeno
sorriso.
-Fitz é seu advogado? –eu
perguntei curiosa.
-Ele faz parte do time de
advogados da empresa. –ele me explicou –Você conhece Fitz?
-Eu o conheci num casamento
que eu fui recentemente. –eu falei sinceramente.
George parecia estar me
analisando com cuidado.
-Na Escócia? –ele perguntou.
O jeito que ele estava me
olhando estava me deixando desconfortável. Emma estava olhando entre nós dois,
claramente curiosa.
-Sim. –eu respondi
hesitante.
-Alguma chance de você ser a
ruiva que deu um fora fenomenal no primo dele? –George perguntou, um pequeno
sorriso em seu rosto.
Eu juro que senti minha cara
ficar vermelha. Meu rosto estava tão quente de vergonha que acho que dava para
fritar um ovo na minha testa.
Emma tinha se virado para
mim, olhos brilhando de curiosidade, quase quicando de vontade de saber a coisa
toda.
-Verdade? –ela exigiu.
-Eu... –Jesus amado, estava
até gaguejando –Eu não acredito que ele saiu contando pra todo mundo!
-Em defesa dele... –George
falou de forma conciliatória –Eu perguntei do casamento e ele me contou de
forma geral o que tinha acontecido. Uma dessas coisas era que uma ruiva tinha
dado um fora em Darcy e agora ele estava mais chato do que o normal.
Ei, eu não vou me sentir
culpada. Aprenda a lidar com foras, homem! Ninguem tem a obrigação de gostar de
ninguem, sabia?
-Darcy, Darcy, Darcy...
–Emma estava repetindo o nome olhando para o teto, batendo as unhas contra a
madeira da mesa –Eu conheço esse nome.
-Ele estava no jantar de
Natal que demos ano passado na empresa. –George lembrou Emma –Você disse que
ele tinha cara...
-De que tinha chupado um
limão. –ela completou, obviamente lembrando-se –Ele ainda tem cara de quem
chupou um limão?
-Tem. –eu respondi cruzando
os braços.
-E ele se declarou para você?
–ela insistiu curiosa.
-Se você pode chamar aquele
discurso dele de declaração... –eu resmunguei.
-Ah essa juventude. –Sr.
Woodhouse lamentou –Não é a toa que o mundo está perdido.
Eu tenho que concordar com
ele.
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Capítulo 16
-Então... Você e o Darcy?
Eu bufei. Devia saber que
Emma não ia deixar passar fácil assim. Ela era curiosa ao extremo e eu tinha
caído na besteira de abrir a boca na frente dela. Agora tinha que aguentar.
-Sabe, nós não temos mais
quinze anos. –eu falei ao ve-la entrar de pijama no quarto onde eu ia passar a
noite e se jogar na cama sem cerimônias –Isso não é uma festinha de pijama, pra
gente ficar fofocando a noite toda.
-Mas eu trouxe esmalte! –ela
falou, balançando o vidrinho roxo.
Eu reverei nos olhos, mas no
fim das contas também sentei na cama e ofereci minhas mãos de forma obediente.
-Vai, Lizzie. Desembucha.
–ela falou depois de ter começado os primeiros dedos.
Eu considerei seriamente não
dizer nada. Ficar quieta, ver se Emma se tocava, mas a verdade era que eu
precisava de uma perspectiva nova. Alguem que não estivesse tão diretamente
envolvido com a bagunça inteira.
Então no fim eu contei tudo
para ela. Desde o primeiro dia que nós nos vimos, até a última mensagem. Quando
eu finalmente terminei Emma ja tinha terminado minhas unhas e eu ja estava
quase acabando as dela.
Ela ficou em silêncio um
pouquinho, como se estivesse pensando antes de falar.
-Você o beijou primeiro.
–ela indicou.
-Ei, não foi provado quem
beijou quem. –eu prostestei, mas era fraco.
-Sim, mas quem beijou
primeiro não importa, a frase saiu errada. O que eu quis dizer é que antes de
ele se declarar, antes de você saber como ele se sentia, vocês ja tinham se
beijado.
-Você sempre disse que
beijos não contam depois da meia-noite. –eu resmunguei.
Emma suspirou e pareceu
pensativa, como sempre parecia quando alguem repetia essa frase dela. Eu sempre
quis saber de onde ela vinha, mas Emma nunca explicou exatamente.
-Não, eles não contam. –ela
falou por fim –Não quer dizer que eles não aconteceram.
-O que você está querendo
dizer com isso? –eu falei por fim.
-Eu não quero que você me
diga nada. –ela falou –Não estou esperando uma resposta, nem nada, mas,
Lizzie... Você não acha que, se você o beijou, alguma coisa tinha ali? Atração?
Uma pontinha de vontade, de curiosidade? Será que a razão pela qual essa
história não saí da sua cabeça é porque, no fim das contas, você não era tão
indiferente quanto acha?
Eu abri a boca, mas Emma
levantou a mão para que eu não falasse.
-Você não tem que falar nada
para mim. –ela reforçou –Eu só quero que você considere. Talvez você não o
odiasse tanto quanto achava. E... –começou com cuidado –Talvez você não esteja
tão brava quanto gostaria.
Eu fiquei olhando em choque
para Emma. Claro que eu estou brava! E com razão!
-Só pensa com cuidado. –ela
pediu mais uma vez, levantando-se –Boa noite, Lizzie.
Eu nem falei nada. Claro que
eu estou brava!
E Darcy merece que eu esteja
brava com ele. Ele foi um idiota. Qual o problema daquela pessoa? Ele podia ter
feito tudo tão mais fácil se ele tivesse dito que...
-Olha, Lizzie, eu sei que você acha que o Darcy é chato, metido e tal...
E eu sei que ele passa essa impressão, mas ele é super gente boa.
-Eu não sou bom em conversar com pessoas que eu não conheço.
-Eu tenho dificuldades em me expressar na maior parte do tempo.
As conversas apareceram na
minha cabeça sem pedir permissão.
Droga.
Droga.
Eu te odeio, Emma Woodhouse.
XxX
Como prometido, Emma não
tocou mais no assunto “Darcy”. Eu mesma tinha passado a noite em claro depois
que ela deixara meu quarto. Sim, eu tinha minhas conclusões, mas elas não
significam nada. Ponto final. Não quero mais falar sobre isso.
Sério, não quero, porque...
Sinceramente, o que adianta? Ele e Charlie tinham ido embora, eu não ia mais
ver nenhum deles; nem Fitz ou Caroline. Não adiantava ficar remoendo coisas que
não iam levar a nada.
Então eu e Emma fomos passar
o dia na cidade, vendo as feiras e almoçamos em um restaurante super fofo. Nós
estávamos voltando para a casa dela quando Harriet, a amiga, começou a enviar
mensagens desesperadamente.
Emma finalmente cansou-se
dos textos sem sentido e ligou para ela.
-Harriet, acalme-se. Eu não
estou entendendo nada. –Emma falou com paciência exagerada –Harriet, respire,
por favor. Se você desmaiar por falta de ar, nós teremos um problema a mais.
Eu tive que segurar um
sorriso. Não era a toa que Emma praticamente comandava a firma do pai. Ela era
uma ótima pessoa para se ter do lado numa crise.
-Ele o que? –ela gritou no
celular, fazendo várias pessoas ao redor nos olharem com caras estranhas.
-O que foi? –perguntei
curiosa.
Emma fez um gesto para eu
esperar.
-Hoje? Como assim hoje? –ela
gritou mais uma vez, então respirou fundo e tentou acalmar-se –Harriet, você
tem certeza? Eu não recebi... –o telefone dela vibrou, indicando uma mensagem
–Espera ai. Ja te ligo de volta.
Eu vi, com grande interesse,
Emma respirar fundo antes de desligar o aparelho –ignorando os gritos
desesperados de Harriet do outro lado. Ela abriu a mensagem e soltou um
palavrão que eu nunca ouvira vindo dela antes.
-O que foi? –eu praticamente
exigi, me corroendo de curiosidade.
-Aquele filho de uma porca
do Elton! –ela esbravejou –Ele vai fazer um “jantar íntimo”... –falou com
desprezo, fazendo uma voz afetada -...para apresentar a futura esposa dele para
a sociedade e mandou convite para a Harriet! E pra mim! –eu achei que ela fosse
arremessar o celular no chão –Babaca! Imaturo! Cretino!
-Hoje? –eu perguntei, porque
era fácil deduzir.
-Sim! Hoje!
-E você vai?
-Eu... –ela parou e respirou
fundo –Eu tenho que ir. Vai pegar mal se eu não for. Lizzie...
-Nem vem. –eu falei na hora
–Eu to vazando. Além do mais, sua amiga vai precisar de um apoio.
-Eu sinto muito. –ela falou
sinceramente arrependida.
-Deixa disso, Woodhouse.
–falei sincera –Vai la e acaba com a raça desse idiota.
Emma assentiu decidida. Se
Elton não fosse um animal eu até ficaria com dó.
Mentira. Ficaria nada.
XxX
Com Emma compromissada pela
noite, resolvi ir embora. Mas ja que estava com a tarde livre e Londres ficava
perto, resolvi fazer um pequeno desvio e passar em Windsor. Fazia muito tempo
que eu não via o Castelo e sempre foi um dos meus lugares preferidos.
Além disso há uma
confeitaria la que faz um bolo esponja que eu e as meninas amamos. Eu podia
pegar um e levar para casa.
Despedi-me de Emma e do pai
dela (deixando beijos para o George) e fui.
Eu passei algumas horas la.
Minha parte preferida do verão por aqui é como os dias são longos. Quando eu
finalmente peguei o bolo na confeitaria e resolvi voltar ja eram sete horas da
noite, mas o sol ainda estava brilhando com força total. Ou o que a gente
considera força total por aqui.
E foi aí que meu karma
resolveu que eu ja tinha tido dias calmos o bastante e estava na hora de me
torrar de novo.
Eu gosto de pegar um estrada
secundária que sai de Windsor antes de cair na rodovia principal que leva a
Londres. O cenário é lindo, calmo, meio isolado. Sabe, o lugar perfeito para o
seu pneu furar.
Eu juro por tudo que é mais
sagrado que alguém la em cima me odeia muito. Eu colei taxinha na cruz. Só
pode.
Eu respirei fundo e consegui
parar o carro no acostamento. Tudo bem, eu gosto de carros, lembra? Eu sei
trocar pneus!
Assim decidida e super calma,
desci do carro, abri o porta-mala e dei de cara com o estepe mais murcho que ja
vi na minha vida. Queria chorar de frustração. Eu tinha checado tudo antes de
viajar: gasoline, pneus, óleo... Mas eu esqueci do maldito do estepe! E
obviamente nenhuma das outras meninas teria lembrado.
Eu queria chorar de
frustração, mas respirei fundo mais uma vez. Dei uma olhadinha no pneu e havia
um prego gigantesco enfiado nele. Eu nem tenho ideia de onde isso saiu porque
eu não passei em cima de nada suspeito.
Pensei em ligar para o
guincho, mas os números que eu tinha só atendiam a região de Londres e a de
onde meus pais moravam, não Windsor. Chequei e o sinal da internet era
inexistente ali, então resolvi ligar para uma das meninas e ver se elas podiam
checar para mim e então retornar.
E adivinha o que? Eu devo
ter parado na única estrada no mundo onde não tinha sinal de telefone. Por que,
Senhor? Por que? Foi porque eu mentia que estava doente para não ir a missa?
Foi porque eu troquei o remédio da Irmã Grace por laxante? Foi só uma vez!
Ta, chega de sentir pena de
mim mesma. Passou, superei.
Eu considerei minhas opções.
Haviam algumas casas e até um B&B por aqui. O duro é que a maioria das
casas eram dos ricos e poderosos e eu duvido que algum deles ia querer me
ajudar, então eu teria que andar até o B&B. Nem era tão longe assim, eu só
esperava chegar até la antes que escurecesse, e o sol ja estava começando a
abaixar. O fim de agosto ja era a época que o dia não durava mais tanto e as
nove horas estaria completamente escuro.
Era melhor começar a andar.
Eu tinha acabado de me
decidir quando vi um carro vindo na minha direção. Um Mercedes SLS prata.
Ótimo, pessoa rica. (Mas sério!!! Esse carro tem porta de asa de gaivota e é
pura perfeição! Não que eu fosse saber por experiência própria, porque eu nunca
entrei em um).
Bom, não custava nada
tentar, então eu balancei os braços.
Miraculosamente o carro foi
diminuindo de velocidade até parar perto de mim. A janela do motorista abaixou
e uma menina olhou para mim. Ela tinha olhos verdes enormes e o cabelo estava
preso numa trança embutida. Ela parecia nova demais para estar dirigindo
sozinha e também parecia vagamente familiar.
-Está tudo bem? –ela me
perguntou preocupada.
-Meu pneu furou e meu celular
não funciona. Eu teria trocado pelo estepe, mas ele está murcho. –eu falei,
incrivelmente aliviada por ela ter parado e por ser uma garota.
-Desculpa, mas... –ela
parecia estar me analisando –Eu te conheço de algum lugar.
-Eu estou com a mesma sensação.
–admiti. Só que eu sou meio ruim com rostos, embora seja pior com nomes.
-Do bar! –ela falou de
repente –The Regent! Você me ajudou a ir embora.
Verdade!
-A menina dos martinis com
azeitona. –sorri.
-Sim. –ela olhou em volta
–Quer vir comigo? Eu estou ficando aqui perto e tenho quase certeza que meu
irmão tem uma daquelas bombas que enchem as coisas de ar e dá pra carregar pra
la e pra ca. –ela falou incerta.
Gente, que gracinha de
menina. Vontade de apertar essas bochechas.
-Por favor. –eu falei
sentindo-me ridiculamente aliviada –Aliás, meu nome é Lizzie.
-Eu sou Gina. –ela sorriu
para mim –Entra ai.
Eu corri para meu carro e
peguei minha bolsa e tranquei tudo. Quase morri quando aquela porta levantou e
quase derreti naquele banco de couro.
Por um minuto me lembrei de
Darcy e daquele carro ridículo dele, mas empurrei o pensamento para longe.
Chega de Darcy na minha vida.
Eu sou mesmo uma anta.
XxX
Sabe aquela sensação de que
você está se esquecendo de alguma coisa? Pois é. Eu estava com ela.
Eu chequei minha bolsa para
ver se estava com meu celular, as chaves do carro, minha carteira... Tudo
estava la. Então não que eu tinha esquecido de alguma coisa física. Era como se
estivesse deixando passar algum fato importante.
-Eu e meu irmão estamos
ficando num chalé aqui perto. –Gina estava me falando –Normalmente nós ficamos
em Derbyshire, mas ele quis ficar mais perto de Londres dessa vez.
-Que sorte a minha.
–brinquei de leve.
-O Will está em casa. –ela
me assegurou –Quando chegarmos la ele pode te ajudar. Só não deixa a cara azeda
dele te assustar. O Will é meio tímido e não sabe falar com estranhos.
E, de repente, tudo clicou.
Gina, olhos verdes, chalé em Derbyshire, o carro prata...
Não! Não! NÃO NÃO NÃO!
Isso só pode ser piada. Deus
do céu, o mundo não pode ser tão cruel assim comigo! Tem que ser tudo uma
grande coincidência!
Mas claro que não era. Os
fatos começaram a se ligar na minha cabeça: Gina estava no The Regent com o irmão, Gina tinha olhos verdes e
cabelo preto e era bem novinha.
CACETE, ESSA ERA A IRMÃ DO
DARCY!
E Will? Ele chamava William?
Depois de toda aquela frescura do Fitz pra me falar o nome de Darcy ele chamava
William? Qual o problema com esse nome? Eu tenho um tio que chama William.
Considerei seriamente pedir
para ela parar o carro e sair correndo na direção oposta, mas ja era tarde
demais: Gina estava entrando por um caminho e eu ja podia ver a casa.
Obviamente o “chalé” deles
não era uma casinha de camponês. A casa era enorme e, embora tivesse um ar meio
bucólico, dava para ver de longe que era bem cuidade (e bem paga).
Gina parou o carro e desceu,
então tive que segui-la. Ela destrancou a porta da frente e foi entrando, eu
não tive escolha a não ser ir atrás.
-Will! –ela chamou –Vem
aqui.
-Gina? O que foi?
Era a voz dele! Ai meu Jesus
amado!
-Eu preciso de uma ajuda.
–ela falou.
-Aconteceu alguma coisa?
–ele perguntou, a voz se aproximando.
Gina estava falando alguma
coisa, mas eu não conseguia ouvir, porque meu coração estava batendo tão alto
que parecia estar soando na casa inteira.
Então Darcy apareceu na
sala, a testa franzida em preocupação. Daí ele olhou de Gina para mim e os
olhos dele se arregalaram em choque, a boca abrindo-se sem som nenhum sair.
-Lizzie? –ele falou a voz
carregada de surpresa.
-Oi, Darcy. –eu tenho quase
certeza de que não gaguejei.
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N/A: Ah Lizzie Bennet! hahahaha Você só apronta mulher!
Gostaram da nossa participação especial?
E Darcy está de volta com Gina dessa vez!
Imagina no que isso não vai dar.
COMENTEM!
B-jão